O ator Robson Santos, que atuou no Teatro Experimental Mogiano (TEM), viaja pelo País para não deixar morrer a arte de contar bem uma história
Luana Nogueira
Da reportagem local
"Quando estou em alguns lugares a sensação é de estar aprendendo mais do que estou ensinando as crianças. A sensação é de estar crescendo cada vez que vou a um lugar diferente."
Perfil
Nome: José Robson dos Santos
Idade: 44 anos
Estado civil: Solteiro
Profissão: Contador de histórias
Pensamento: "Longe é um lugar que não existe"
Por que Mogi: "Porque as primeiras histórias que aprendi foram daqui"
As histórias de boitatá, mula sem cabeça e saci-pererê permearam a imaginação do contador de histórias José Robson dos Santos, de 44 anos, desde a infância. A arte entrou em sua vida como um sopro de esperança enquanto passava um período no Hospital Presidente, em São Paulo. A distância dos amigos e da família fez com que ele compensasse a solidão escrevendo histórias que, mais tarde, se tornariam roteiros de teatro.
Ingressou ainda adolescente no Teatro Experimental Mogiano (TEM) e dentro do grupo reativou a vertente voltada para o público infantil, o Temzinho. Decidiu cursar o Magistério, por acaso, e a partir daí, começou a aprimorar suas técnicas e descobriu a contação de histórias. Com fantoches, livros e imaginação, Santos leva a alegria para as crianças nos quatro cantos do Brasil.
Referência na área, percorre o País ministrando palestras e workshops em empresas, escolas e faculdades. O objetivo do contador de histórias é sensibilizar os profissionais e não deixar que a arte de contar bem uma história se perca com o tempo.
Mogi News: Você nasceu em Mogi?
José Robson dos Santos: Nasci no hospital Mãe Pobre, no centro de Mogi. Minha mãe (Eunice) era de Casa Grande, bairro de Biritiba Mirim. Depois que nasci, nos estabelecemos em Mogi. Passei a maior parte da minha infância no Jardim Camila. Naquela época, lá não tinha asfalto, nem luz.
MN: Quando as histórias entraram em sua vida?
Santos: Quando tinha 7 para 8 anos, ganhei uma bicicleta de Natal e fui atropelado quando ia buscar minha mãe nas compras. Fiquei um tempo longe de casa, pois não existiam recursos em Mogi. No Hospital Presidente, em São Paulo, passei a escrever para poder passar o tempo. Quando voltei a frequentar a escola, minha professora disse que eu escrevia teatro. Pegamos um dos meus textos e encenamos na escola. Gostava muito de ler poesias e fugia da escola para ir à biblioteca municipal. Estudava na escola Professora Enedina Gomes de Freitas e representava a unidade nos concursos de poesia. Passei a desenhar para ilustrar os textos ou os roteiros das peças de teatro. O teatro entrou na minha vida na fase escolar, mas advindo de uma necessidade de extravasar um pouco da solidão.
MN: Quem te contou as primeiras histórias?
Santos: Meu avô (José Lemes da Cunha) contava muitas histórias. Ele era de Casa Grande, funcionário do Daee (Departamento de Água e Energia Elétrica) e por isso vivia muito no mato. O bairro era um lugar muito inóspito. Meu avô fazia muitas trilhas, descia para o litoral por esses caminhos e trazia muitas histórias sobre mula sem cabeça, boitatá e saci-pererê. Escutávamos as lendas durante a noite e aos fins de semana. Essas histórias eu trago dele, mas a contação de história veio por meio do Magistério.
MN: Sempre quis fazer Magistério?
Santos: Fiz Magistério meio que por acaso. A partir disso, passei a me interessar por atividades lúdicas para crianças. Um dia, uma amiga apareceu chorando, perguntei o que estava ocorrendo e ela me explicou que queria fazer Magistério, pois a mãe dela era professora, mas que as vagas para o curso tinham acabado. Como todos gostavam de mim, pois era o representante da escola, fui falar com a diretora. Disse que sabia que abririam vagas para o Magistério e que tinha muito interesse em cursar. Comentei que tinha muita vontade de fazer teatro voltado para crianças. Ela me disse que daria um jeito e perguntei se podia levar uma amiga para não me sentir deslocado, a diretora aceitou. Fizemos a matrícula, mas no final minha amiga desistiu do curso e eu continuei.
MN: Pensava em seguir outra carreira?
Santos: Queria fazer teatro e surgiu o Magistério. Depois, apareceram os estágios e comecei a contar as minhas histórias. Em 1993, trabalhei no Sesi (Serviço Social da Indústria), onde desenvolvi atividades lúdicas baseadas em jogos dramáticos, usava muito a improvisação teatral. Em 1994, fui chamado para fazer um trabalho em uma escola infantil de Poá. As crianças eram recebidas e iam embora ouvindo histórias. A mantenedora do espaço me forneceu textos, em alemão e francês, traduzidos por ela, sobre a arte de contar histórias, pois ainda não existiam livros sobre o tema no Brasil.
MN: Fez cursos para se aperfeiçoar na área?
Santos: Fiz cursos técnicos, cursos de teatro, laboratórios e oficinas em São Paulo. Fui muito autodidata, realizei muita pesquisa, passava noites para entender uma coisa que alguma pessoa tinha me falado. Na época não tinha internet, vivia pesquisando, emprestando livros e acabei criando uma pequena biblioteca. Tudo o que eu fazia na área de teatro eram cursos que meus amigos indicavam ou porque pesquisava em livros.
MN: Quando passou a se dedicar mais à contação de histórias?
Santos: Em 1995, optei por só contar histórias. Nesse período, terminei a minha pesquisa nesta área, até então era um processo de experimentação. Depois fui estudar as técnicas e descobrir, por exemplo, para que serve contar com livros, com bonecos ou verbalmente. Quando terminei esse estudo, dei uma oficina em Mogi. O workshop foi realizado no teatro municipal e veio gente do Brasil todo, do Mato Grosso, do Rio Grande do Sul e do interior de São Paulo. Atendemos a maior parte da rede oficial de ensino, tanto particular quanto pública. A partir disso, minha vida começou a ganhar as cores da contação de histórias.
MN: Em que momento criou o grupo Arte e Palco?
Santos: A partir de 1995, criei um grupo dentro do Teatro Experimental Mogiano (TEM) voltado para trabalhos infantis. O Temzinho já existia e decidi reativá-lo. Dentro disso, surgiu um núcleo de contação de histórias, mas para ir à São Paulo, não podia ser com o TEM, pois pareceria muito bairrista, por isso, criamos o grupo Arte e Palco: Contadores de Histórias. Ele surgiu em 1998, no período que me direcionei para a contação de histórias. É com ele que me apresento até hoje dentro e fora de São Paulo.
MN: Qual a sensação de contar histórias para crianças?
Santos: Quando vou contar histórias fico muito apreensivo, especialmente em cidades regionalistas que contam com uma cultura popular e oral muito fortes. Como faço as minhas histórias, reconto algumas, mas a maioria sou eu que conto, faço e crio, é o que me dá um pouco de segurança. Quando vou nesses lugares a sensação é de estar aprendendo mais do que estou ensinando as crianças. As deixo muito livres para interferir em minhas histórias. A sensação é estar crescendo cada vez que vou a um lugar diferente.
MN: Quais os planos para o futuro?
Santos: A perspectiva é que a valorização da contação de histórias para que essa cultura tenha espaço dentro das escolas. É difícil encontrar pessoas que se sensibilizem com o tema, mas faço essa sensibilização por meio de cursos, palestras e oficinas. É isso que me faz viajar tanto pelo Brasil afora.